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ENTREVISTA: TALL, PIET.
Tall, Piet foi criado por Eduardo Tallia e Duda di Pietro, em 2022. O estúdio reúne um grupo de talentos espalhado por todo o mundo que trabalha com marcas, pessoas ou iniciativas que estão remodelando o futuro. Em novembro de 2022, a dupla ministra o curso Identidade visual: desmistificando o processo criativo, aqui no Espaço.CC.
Espaço.CC: Como vocês descreveriam o processo criativo de vocês?
Eduardo Tallia:
Acho que o objetivo da desconstrução do processo criativo é justamente humanizá-lo; é trazer para perto; é desmistificar a ideia do gênio. Na minha opinião, não existe forma sem intenção; e a intenção é construída através de um encadeamento de ideias, raciocínios e mensagens. O processo criativo serve como uma extração da identidade por meio dessas intenções. A forma (o resultado) é uma consequência disso tudo, ela não é o princípio.
Duda di Pietro: Pra mim, o princípio do processo criativo está em entender que as contribuições virão de todos os lados. Não existe um detentor da visão criativa, mas sim uma soma de pontos de vista que, juntos e refinados pelo líder do projeto, chegam num resultado muito mais rico e único. Para isso é importante que todos os envolvidos estejam abertos e vulneráveis, que sintam que suas ideias são relevantes mesmo quando vão sendo transformadas ao longo do processo. Idealmente não conseguiremos nem identificar até onde foi a contribuição de um e onde entrou a de outro, por que a coisa se mesclou tanto que é de todo mundo.
CC: Quais vocês consideram três pontos-chave de uma boa prática de trabalho?
E.T: (1) Diálogo, (2) compreensão das nossas vulnerabilidades e (3) intenção.
Acho que o diálogo é um ponto fundamental na elaboração de um trabalho. O trabalho é uma construção e a construção é resultado do diálogo.
Compreender nossas vulnerabilidades é aceitar o erro da mesma forma que aceitamos o acerto; é ter coragem para encarar o incerto e a imperfeição. Somos ensinados a esconder nossas vulnerabilidades e vulnerabilidade é uma forma de nos conectarmos profundamente. É saber que nem sempre temos a certeza, é valorizar o "não sei" da mesma forma que valorizamos o "sim" e o "não".
A intenção é buscar uma mensagem através das nossas escolhas, é a busca por comunicar através de uma tipografia, de uma cor, de uma composição. É fazer com que nosso trabalho tenha um propósito, um significado.
D.d.P: Concordo com os três que o Dude trouxe e acrescentaria mais um: aprendizado. Todo o processo nos traz aprendizados e eles acabam sendo ferramentas incríveis para o próximo projeto.
CC: Como vocês diriam que a forma como as pessoas se organizam profissionalmente afeta o processo criativo e o resultado final do projeto?
E.T:
Acredito que a organização é fundamental para dar mais espaço para que o processo criativo aconteça. É tirar as arestas, a burocracia e fortalecer o diálogo e as intenções. É dar espaço para o humano no processo. No meu ver todos nós nascemos criativos, todos nós temos a criatividade em nós, mas à medida que vamos sendo inseridos em uma maneira social ditada pela lógica da produção em escala vamos sendo moldados a algo que deve se encaixar em um modelo, em um formato. Ou seja, analogamente, é como a sociedade se organizou "profissionalmente", não dando espaço para que o lado humano/criativo se manifeste.
D.d.P: Acho que a questão mais importante de se ter resolvida antes de começar um projeto é um entendimento entre todos do problema que queremos resolver e onde queremos chegar. A partir daí tudo acontece de forma mais orgânica, seja a escolha de parceiros, caminhos criativos, etc. Tudo se desenrola de maneira mais fácil quando se entende o que precisa ser feito.
CC:
Parte do projeto do curso “Identidade Visual: desmistificando o processo criativo” é incentivar as pessoas a não esconderem suas vulnerabilidades, erros e inseguranças, usando o processo criativo como oportunidade para trabalhar com elas. Quais algumas inseguranças que vocês superaram nas suas práticas? Como vocês consideram que ter passado por elas alterou substancialmente os seus projetos e processos?
E.T: Talvez esse seja o ponto principal dos encontros. Não acredito na ideia do gênio; do rockstar criativo. Acho que quando nos colocamos nesse lugar, quase como heróis, nós deixamos as vulnerabilidades de lado, como se elas não existissem e com isso reforçamos o lugar da angústia, do não pertencimento, do incapaz no outro. Nós acabamos por anestesiar nossas vulnerabilidades e, fazendo isso, acabamos por anestesiar outros sentimentos como a alegria, o lado divertido do fazer, a felicidade, o aprendizado. Ou seja, um mundo muito ruim para todos nós.
Lidamos com essas inseguranças, incertezas e angústias em todos os projetos, mas optamos por abraçar e expor essas vulnerabilidades como uma forma de nos conectar, não só com o projeto, mas com as pessoas que estão construindo esse projeto junto com a gente, seja com um cliente ou um colega. E o resultado da conexão é, de certa forma, um sentimento de pertencimento, fazendo com que todos se sintam responsáveis pelo trabalho; e isso, ao meu ver, muda tudo.
D.d.P: A insegurança passa por todos os lugares: dúvidas sobre o próprio talento, rapidez para achar as soluções, sobre não acertar, tentar adivinhar a expectativa do outro em relação à gente e buscar isso. Tentar fazer o que o seu amigo (que você acredita ser o mais talentoso) faria. E acho que aí entramos naquele loop infinito de tentativa e erro, pq simplesmente me desconectei completamente de mim e do que eu acredito. E pra mim, pessoalmente, esse foi o maior aprendizado, em muitos processos: não tentar criar a partir do que eu acho que o outro quer, ou a partir de como o outro faria e confiar na minha intuição, no meu jeito de fazer. Compreensão das características individuais e entre cada um e transformar as diferenças em complementaridades.